André Vignatti leva a profundidade da ciência da computação teórica ao Prêmio Jabuti

Obra desafia a visão comum de que ciência da computação limita-se a aplicações práticas, evidenciando que a computação teórica trata de questões filosóficas profundas e conexões com as ciências naturais.

O professor André Vignatti, do Departamento de Informática da Universidade Federal do Paraná (UFPR), conquistou o Prêmio Jabuti 2025 na categoria Ciência da Computação com seu livro A Máquina da Natureza: uma Perspectiva Cronológica da Ciência da Computação Teórica. A obra inovadora, que combina ciência da computação, filosofia e ciências naturais, aborda aspectos pouco explorados da área, questionando a percepção comum da computação como mera técnica aplicada.

Prata da casa, Vignatti é formado em Ciência da Computação na UFPR, com doutorado pela Unicamp, e pós-doutorado pela Università degli Studi di Salerno, na Itália. Em sua obra, o professor da UFPR enfatiza que a ciência da computação teórica não deve ser reduzida às inovações tecnológicas passageiras. Para ele, os fundamentos mais profundos da área estão ligados a questões filosóficas, como os limites do pensamento racional, a relação entre determinismo e aleatoriedade, e a própria essência da computação, ancorada na tese de Church-Turing – um conceito que propõe um modelo universal para todo tipo de computação.

Um aspecto central abordado na obra é o papel da informação como componente fundamental da natureza, ao lado da matéria e da energia. A ciência da computação teórica estuda a manipulação dessa informação em níveis abstratos e fundamentais, o que nos permite entender desde o funcionamento do DNA até as implicações sociais e éticas na era digital, ressalta o professor.

Além da riqueza de conteúdos, o livro é escrito em linguagem acessível, destinado a público diverso – de especialistas a curiosos. Vignatti afirma que o maior desafio foi justamente tornar conceitos complexos, como reduções e pseudoaleatoriedade, compreensíveis para leigos, tarefa que consumiu a maior parte do tempo da escrita.

Em entrevista abaixo, o professor comenta o impacto do Prêmio Jabuti para a valorização da ciência da computação no Brasil, reflete sobre o futuro da área diante do avanço do aprendizado de máquina e da inteligência artificial, e ressalta a importância de aproximar a ciência da computação da sociedade para além dos aspectos tecnológicos imediatos.

Esta reportagem integra uma série de entrevistas promovidas pelo Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL) e Dinf. A iniciativa busca destacar a trajetória e as contribuições de ex-bolsistas, alunos e pesquisadores que se destacam no campo da informática, mostrando a diversidade e o impacto das pesquisas desenvolvidas nesse ambiente acadêmico e tecnológico de excelência.

C3SL – O que significa para você receber o prêmio Jabuti com seu livro?

VIGNATTI – Primeiramente, o prêmio Jabuti foi importante para dar visibilidade à ciência da computação teórica. Hoje, essa área representa apenas cerca de 10% da pesquisa em computação no Brasil e no exterior. Acredito que essa baixa porcentagem se deve ao frenesi tecnológico, que cria a falsa impressão de que a ciência da computação se resume às aplicações práticas. Para mim, não trabalhamos com uma ciência cujas principais questões são as aplicações tecnológicas. Pelo contrário, as novidades tecnológicas muitas vezes ofuscam os objetivos mais profundos da área, que se conectam a questões filosóficas e naturais. Meu objetivo com o livro é justamente explicitar esses objetivos.

Além disso, a conclusão deste livro foi um grande desafio, e eu não sabia como o livro seria recebido pelo público. Desta forma, vencer o Prêmio Jabuti representa o reconhecimento de um trabalho árduo, que levou anos. 

C3SL – Como o prêmio Jabuti impacta a valorização da ciência da computação no Brasil?

VIGNATTI – A escrita de um livro é um processo complexo e trabalhoso, que pode desencorajar muitos acadêmicos. Nem sempre há muitos incentivos e, de acordo com as métricas acadêmicas tradicionais, o tempo investido em um livro pode não ser tão valorizado quanto outras atividades. Nesse contexto, a existência de um prêmio tão prestigioso como o Jabuti, que inclui uma categoria específica de ciência da computação, é fundamental para o reconhecimento do trabalho de autores e a valorização da área no Brasil.

C3SL – Quais próximos projetos acadêmicos ou literários você pretende desenvolver após essa obra?

VIGNATTI – Ainda não tenho certeza. A experiência com este livro, e o impacto que ele gerou mesmo antes do Prêmio Jabuti, me mostrou que projetos de longo prazo valem o esforço. Por isso, minha intenção é iniciar algo que tenha um impacto significativo, ainda que eu não saiba exatamente qual será o próximo passo.

C3SL –  Como você vê o futuro da ciência da computação teórica nas próximas décadas?

VIGNATTI – A ciência da computação teórica tem um futuro promissor, com muitos tópicos para explorar. No entanto, sua relação com a área geral da computação deve ser turbulenta nas próximas décadas. Historicamente, a teoria sempre teve uma forte influência. Cerca de 40% dos Prêmios Turing, por exemplo, foram para pesquisadores teóricos. Por muito tempo, a relação entre pesquisa teórica e experimental foi saudável. Contudo, nos últimos 10 ou 15 anos, isso mudou.

Acredito que o principal fator dessa mudança é o sucesso do aprendizado de máquina. Essa área, que vejo como um novo paradigma de solução de problemas, transformou a ciência da computação em algo mais próximo da engenharia. A busca por novas formas de solucionar problemas é basicamente o que move a área de ciência da computação, então, neste sentido, são boas notícias. O problema é que a teoria e a prática desse novo paradigma de resolução de problemas estão muitos distantes um do outro, cada vez se distanciando mais. Hoje, a pesquisa experimental foca em usar esse novo paradigma, na maioria das vezes sem uma base teórica sólida, e não vejo uma maneira simples de aproximar a teoria e prática nesse contexto. 

Apesar disso, vejo um futuro promissor para a ciência da computação teórica em outra frente: os impactos sociais da tecnologia, como educação, comunicação em mídias sociais, ética e meio ambiente. A computação teórica possui as ferramentas certas para auxiliar em pesquisas nesses temas. 

Conceitos como conluio, conflito, equilíbrio, justiça, interação, linguagem e privacidade são apenas alguns exemplos de tópicos que já são estudados pela computação teórica e que muito certamente vão auxiliar nesses assuntos.

C3SL – Como surgiu a ideia de escrever um livro que conecta ciência da computação teórica com filosofia e ciências naturais?

VIGNATTI – O estudo da ciência da computação teórica ocorre, por padrão, abandonando completamente a influência de aspectos tecnológicos. Para quem enxerga de fora, isso parece contraditório – não seria a ciência da computação o estudo das tecnologias computacionais? Se a computação teórica ignora a tecnologia, o que ela estuda? Ao nos libertarmos da “névoa” das aplicações tecnológicas, percebemos que a essência da computação teórica está em questões que se conectam com a filosofia e as ciências naturais. Meu livro busca justamente dissipar essa névoa, tornando essas questões explícitas e acessíveis.

C3SL – Qual foi o maior desafio ao tentar explicar conceitos complexos em linguagem acessível?

VIGNATTI – Dentre diversas formas de explicar, o maior desafio é encontrar a forma mais adequada. O processo é simples na teoria: basta imaginar que você está explicando para alguém totalmente leigo. Na prática, porém, o que custa caro é o tempo gasto para chegar a essa explicação intuitiva. De fato, foi isso o que demandou maior tempo na escrita do meu livro. Conceitos como semântica da lógica, reduções e pseudoaleatoriedade, apenas para ilustrar, são apenas alguns dos casos onde gastei muito tempo até obter uma explicação que eu considerasse satisfatória. Nos meses recentes, ao dar aulas sobre o tema, alguns alunos me agradeceram por finalmente entenderem a ideia de “redução”. Situações assim mostram que, apesar do esforço, o resultado é extremamente recompensador.

C3SL –  É possível explicar de forma simples, o que realmente significa? O que é computação, e em qual local ela está na vida das pessoas?

VIGNATTI – Não há uma resposta definitiva para essa questão. Aceitamos, sem uma prova matemática, que o que Alan Turing definiu como computação é o verdadeiro significado do conceito. Essa suposição, chamada Tese de Church-Turing, tem se mantido válida ao longo dos anos, pois ninguém conseguiu criar um modelo de computador “mais capaz” do que o computador abstrato de Turing. Em seu trabalho, Turing demonstrou que existe um algoritmo capaz de executar qualquer outro algoritmo. Esse algoritmo universal é o que hoje conhecemos como computador. É essa característica notável de ser o algoritmo mais genérico possível que permite ao computador encontrar aplicações em inúmeros contextos, explicando por que ele está tão presente em nosso dia a dia.

C3SL – Como a ciência da computação teórica pode contribuir para outras áreas do conhecimento, além da tecnologia?

VIGNATTI – Conexões com a filosofia, a física, a matemática e a biologia são bons exemplos. A própria ideia de computação nasceu de uma discussão filosófica de mais de 2.000 anos sobre a busca pela verdade absoluta. Um quarto do meu livro aborda essa “pré-história”, mostrando como chegamos ao conceito atual de computação. A partir dessa definição, surgem conexões com questões como o livre-arbítrio, que se relaciona com o problema da parada, e a consciência humana, que se conecta à Tese de Church-Turing.

Quando a questão da eficiência dos algoritmos se tornou central, a contribuição para outras áreas se intensificou. Por exemplo, o trabalho de físicos e matemáticos pode ser visto como um problema de decisão da classe NP. A principal pergunta em aberto hoje na ciência da computação é se “P=NP?” e, se for resolvido positivamente, em termos simples, não seriam mais necessários físicos ou matemáticos, apenas para exemplificar uma das consequências.

Outra área impactada é a biologia. Por exemplo, há uma equivalência quase direta entre o DNA e as sequências de caracteres estudadas na computação. Essa conexão pode levar ao desenvolvimento de uma teoria da evolução quantitativa, uma ideia que já rendeu um Prêmio Turing.

Outra aplicação vem da conexão com a física, onde o princípio da incerteza de Heisenberg sugere a existência de aleatoriedade real na natureza. Os físicos constataram a aleatoriedade na natureza, mas não trouxeram consigo uma explicação de seu significado. De fato, as explicações mais recentes sobre o assunto vêm da ciência da computação teórica. O Prêmio Turing de 2023, por exemplo, foi concedido a Avi Wigderson por seu trabalho que tenta explicar o papel da aleatoriedade na computação e no mundo real.

C3SL –  Qual o conceito de manipulação da informação explorado pelo professor, e como esta manipulação impacta a sociedade atual?

VIGNATTI – A ideia é que a informação pode ser vista como um elemento fundamental da natureza, da mesma forma que matéria ou energia. Normalmente, a física estuda a natureza decompondo-a em componentes básicos como matéria, movimento, espaço e tempo. A ciência da computação teórica, por outro lado, estuda a informação e suas transformações. Se aceitarmos a informação como um componente básico da natureza — e essa aceitação é, essencialmente, uma questão epistemológica —, a computação se torna uma ciência fundamental. Um exemplo simples é a cor de uma maçã. Para a física, a cor é um fenômeno complexo, descrito como um campo eletromagnético de fótons. Para a ciência da computação, a cor pode ser representada de forma muito mais simples: com três números que indicam as quantidades de vermelho, verde e azul. Essa abordagem nos permite manipular e estudar a natureza a partir da informação.

C3SL –  Como professor e pesquisador, qual a importância de aproximar a ciência da computação do público geral por meio de livros como este?

VIGNATTI – Muitos estudantes e profissionais de ciência da computação se incomodam por serem associados a funções como remover vírus ou consertar impressoras. Essa percepção equivocada existe porque as aplicações tecnológicas — o que o público vê e usa — agem como a “comissão de frente” da nossa ciência, escondendo o que realmente fazemos.

Curiosamente, grande parte do avanço tecnológico que a sociedade vivencia está ligada ao hardware, e não à ciência da computação em si. Os smartphones, por exemplo, só existem porque o hardware foi miniaturizado. O alvoroço em torno da inteligência artificial se deve, em grande parte, aos hardwares que finalmente são capazes de executá-la. É claro que, do ponto de vista da ciência da computação, sabemos que o desenvolvimento de algoritmos foi fundamental para essas tecnologias, mas para o público esses avanços acabam ficando em segundo plano. Se tivéssemos hardwares tão bons quanto os de hoje já em 1940, a percepção do público sobre a nossa área seria mais justa. Nessa realidade hipotética, os avanços tecnológicos não seriam anuais, mas pontuais — digamos, a cada 10 anos —, e isso tornaria os reais objetivos da ciência da computação muito mais explícitos. Em outras palavras, o avanço tecnológico que o público experimenta hoje pode estar mais relacionado à melhoria de tecnologias subjacentes do que à própria ciência da computação.

O meu livro busca exatamente corrigir essa percepção. Ele mostra que o principal papel da ciência da computação teórica não é gerar avanços tecnológicos. Pelo contrário, a área está no mesmo patamar da física teórica, com assuntos nobres e profundos. Suas conexões estão mais próximas do estudo da natureza do que de meras tecnologias usadas em nossos sistemas sociais ou econômicos.

Artigo do C3SL sobre gamificação na rede social MECRED é aprovado no IHC 2025

Pesquisa usa framework 5W2H para diagnosticar elementos de jogos, e reforça importância de práticas participativas com educadores na criação de jogos digitais

A MECRED, maior rede social da educação do Brasil, estará no Simpósio Brasileiro sobre Fatores Humanos em Sistemas Computacionais (IHC 2025). O evento será realizado entre os dias 8 e 10 de setembro, na capital mineira. Criada pelo Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL) em parceria com o Ministério da Educação, a rede é tema de artigo aprovado para apresentação no evento nacional de destaque na área Interação Humano-Computador.

O trabalho “Gamificar para engajar: Utilizando o framework 5W2H para o diagnóstico de elementos de jogos na MEC RED” tem como objetivo propor uma análise dos elementos de gamificação presentes na rede social. Os pesquisadores propõem diagnosticar e aprimorar os mecanismos que estimulam o engajamento e a permanência dos profissionais da educação na plataforma. O artigo é assinado pelos pesquisadores de graduação do C3SL, Gabriela dos Santos e Mariane Cassenote, pelo ex-bolsista do C3SL, Nicolas Rizzardi; pela pesquisadora de doutorado do C3SL, Krissia Menezes; e pelos professores do Dinf e pesquisadores sênior do C3SL, Roberto Pereira e Rachel Reis.

A MECRED é uma plataforma pioneira voltada para o compartilhamento de recursos educacionais digitais, com foco na colaboração entre professores e profissionais da educação de todas as regiões do Brasil. A rede social conta hoje com mais de 45 mil usuários e 35 mil recursos disponíveis gratuitamente, hospedados exclusivamente em datacenter próprio do C3SL na UFPR.

O estudo apresentado no IHC analisa a gamificação da MECRED — ou seja, a incorporação de elementos de jogos para melhorar a experiência do usuário e estimular maior participação. Utilizando o framework 5W2H, que considera sete dimensões essenciais para a avaliação (Quem?, O quê?, Por quê?, Quando?, Onde?, Como? e Quanto?), a pesquisa identificou 12 elementos de jogo na plataforma, como coleções, níveis, pontos, medalhas, conteúdos desbloqueáveis, status social e premiações.

Mesmo identifica de tais elementos, o diagnóstico indica que a gamificação na MECRED está concentrada em níveis básicos e intermediários (componentes e mecânicas), e que com isso ficam faltando as dinâmicas mais abstratas que engajam profundamente os usuários. A pesquisa também aponta falta de clareza nos critérios, recompensas e objetivos dos elementos dos recursos de gamificação postados na rede, bem como pouca integração entre eles. De acordo com o estudo, isso pode resultar em experiência fragmentada, o que dificulta a permanência e maior engajamento dos docentes.

As principais contribuições do estudo incluem um diagnóstico estruturado e detalhado da gamificação na MEC RED a partir do 5W2H, que aponta pontos fortes e limitações, bem como oportunidades explícitas para aprimorar a experiência do usuário. O estudo sugere a importância de um redesign que integre melhor os elementos de jogo, elevando-os para níveis mais abstratos e alinhando-os claramente aos objetivos pedagógicos e sociais da plataforma.

Pesquisadores do C3SL concorrem ao prêmio de melhor artigo na trilha Relatos de Experiência do IHC 2025

Os estudos investigam como a IHC pode transformar práticas educativas e sistemas públicos de saúde, ampliando a participação, o engajamento e sua eficiência

Pesquisadores de graduação e pós-graduação do Centro de Estudos sobre Sistemas Complexos (C3SL) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) estão entre os finalistas do prêmio de melhor artigo na trilha relatos de experiência do XIX Simpósio Brasileiro sobre Fatores Humanos em Sistemas Computacionais (IHC). A ser realizado em Belo Horizonte entre os dias 8 a 10 de setembro, o IHC 2025 é o principal fórum científico da área de Interação Humano-Computador no Brasil. Na lista dos concorrentes ao prêmio estão o pesquisador do C3SL e professor do Dinf, Roberto Pereira, e os bolsistas de pós-graduação Krissia Menezes e Jonas Lopes Guerra.

Os trabalhos indicados para concorrer ao prêmio foram aprovados para apresentação no evento. A trilha relatos de experiência do IHC privilegia trabalhos que tragam narrativas detalhadas sobre práticas, projetos e vivências em IHC, contextualizados e fundamentados teoricamente.

Um dos finalistas é o artigo intitulado “Percepções e experiências sobre ensino e aprendizagem de uma disciplina de IHC com foco em práticas colaborativas”, de autoria da doutoranda em informática pelo PPGInf e pesquisadora do C3SL, Gabriela Corbari dos Santos, e da professora adjunta do Departamento de Informática (Dinf) e integrante da equipe de IHC da UFPR, Natasha Malveira Costa Valentim.

O artigo de Gabriela e Natasha apresenta um relato de experiência sobre o ensino da disciplina de IHC em 2024 nos cursos de Ciência da Computação e Informática Biomédica da UFPR. Segundo a pesquisa, o objetivo da disciplina foi capacitar alunos com noções básicas de IHC a partir de uma perspectiva socialmente consciente e orientada a projetos de software, enfatizando a prática colaborativa.

O curso foi estruturado em torno de dois trabalhos práticos (TPs): o primeiro direcionado à avaliação de usabilidade, experiência do usuário (UX) e acessibilidade do app HandTalk — que traduz português para Libras — e o segundo focado no desenvolvimento de um protótipo de aplicativo para pessoas com deficiência visual. Nessas atividades, os alunos aplicaram técnicas reconhecidas na área, como personas, cenários, análise hierárquica de tarefas (HTA), GOMS e métodos de avaliação variados, dentre eles as heurísticas de Nielsen e o percurso cognitivo.\

O relatório final do estudo, que será debatido no IHC 2025, apresenta sete lições aprendidas, entre as quais se destacam: a importância da motivação individual, o uso combinado de múltiplas técnicas de avaliação, a eficácia dos métodos de inspeção para avaliações rápidas e o valor do design socialmente consciente. No artigo, Gabriela e Natasha reforçam que o ensino de IHC deve ir além da aplicação técnica, incorporando valores sociais para formar profissionais preparados para os desafios do futuro.

Outro trabalho que também está entre os que concorrem o prêmio na trilha relatos é o intitulado “Design Socialmente Consciente na Prática: Concebendo uma Solução para o Gerenciamento de Campanhas no SUS”, de autoria do doutorando do PPGInf, Deógenes Pereira da Silva Junior; da doutoranda pelo PPGInf e pesquisadora do C3SL, Krissia Menezes; da pesquisadora e bacharel em Informática Biomédica pela UFPR, Marisa Sel Franco; mestrando em informática pelo PPGInf e pesquisador do C3SL, Jonas Lopes Guerra; e do pesquisador do C3SL e coordenador da equipe de IHC da UFPR, Roberto Pereira.

 O relato de experiência abordado no trabalho é referente ao design de uma solução tecnológica para apoiar o gerenciamento de campanhas de saúde da Atenção Primária à Saúde (APS) no Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil, considerando a complexidade socioeconômica, cultural e geográfica do país. A proposta buscou integrar a diversidade das necessidades das partes interessadas, em especial os Agentes Comunitários de Saúde (ACS), Agentes de Combate às Endemias (ACE) e gestores municipais, adotando o framework de Design Socialmente Consciente (DSC).\

A equipe aplicou uma combinação de métodos exploratórios, como revisão bibliográfica e netnografia em redes sociais, além de técnicas do DSC para mapear os desafios, identificar stakeholders, definir personas e cenários, e especificar requisitos para a solução. Um protótipo de média fidelidade foi desenvolvido para ilustrar a proposta, priorizando funcionalidades que atendem às necessidades da comunicação, gestão e avaliação das campanhas em contextos vulneráveis e diversificados.

Nas considerações do trabalho, os pesquisadores apontam que o DSC demonstra ser um caminho promissor para enfrentar a complexidade intrínseca de soluções que devem operar nacionalmente. A pesquisa reforça ainda que priorizar a proximidade e o engajamento dos agentes de saúde com a população, simplificar processos administrativos e garantir acessibilidade são pontos cruciais para o sucesso das campanhas. Também alerta para possíveis conflitos entre a necessidade de indicadores mensuráveis para gestores e a importância do vínculo humano entre agentes e comunidade, que nem sempre é quantificável.

C3SL promove encontro de integração com novos bolsistas de graduação

Selecionados entre 71 inscritos, os novos pesquisadores atuarão em projetos estratégicos nas áreas de educação, saúde e políticas públicas, sob a orientação de professores e gestores do C3SL

O Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL) realizou nesta segunda-feira (11) o primeiro encontro geral dos novos bolsistas de 2025. O encontro foi realizado no auditório do Departamento de Informática (Dinf) e reuniu os pesquisadores de graduação dos cursos de Ciência da Computação e Informática Biomédica aprovados no último edital de seleção. Participaram do encontro professores do Departamento de Informática (DINF) e pesquisadores do C3SL, como Marcos Castilho, Roberto Pereira, Eduardo Almeida, Letícia Peres, Raquel Reis, Vinicius Fulber-Garcia, Simone Dominico e Carlos Alberto Martins de Carvalho, além da gestora de projetos de pesquisa e desenvolvimento do C3SL, Ianka Antunes.

Durante a reunião, os coordenadores apresentaram a origem e o desenvolvimento de três projetos principais atuais vinculados ao C3SL. Um deles é a MECRED, maior rede social da educação do Brasil. A MECRED é uma parceria entre o C3SL e o MEC e tem papel importante na educação básica e fundamental no país. Outro projeto do C3SL é a plataforma de Dados Educacionais para Políticas Públicas (Depp), projeto dedicado à organização, análise e disponibilização de dados e indicadores da educação básica e superior em séries históricas. Dentre outras funcionalidades, a plataforma permite acesso em diferentes níveis de desagregação para apoiar a formulação de políticas públicas educacionais mais eficientes.

O terceiro projeto relatado no encontro é o APSUS, em desenvolvimento em parceria com o Ministério da Saúde. Trata-se de um sistema de informação para Atenção Primária à Saúde, (APS), que é a principal porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil. Ela funciona como o primeiro contato do cidadão com o sistema de saúde. O projeto é voltado ao desenvolvimento de soluções tecnológicas para a comunicação e gestão na atenção primária à saúde, e busca melhorar a eficiência e a qualidade dos serviços de saúde pública.

Os novos bolsistas terão dedicação de 20 horas semanais e atuarão presencialmente nos laboratórios do C3SL, integrando equipes multidisciplinares compostas por professores doutores, pesquisadores de mestrado, doutorado e graduação.

Soberania tecnológica e Lei da Informática: reitor da UFPR e ministra Luciana Santos se reúnem em Brasília

Reunião no Ministério da Ciência e Tecnologia é desdobramento de projetos do C3SL, em discussão desde 2024 com o órgãos do MCTI

Com a soberania tecnológica brasileira na pauta, o reitor da Universidade Federal do Paraná  (UFPR), Marcos Sunye, e a ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Luciana Santos, se reuniram, em Brasília, no dia 29 de agosto, para discutir a estruturação de projetos na área. Além de apresentar as demandas da UFPR ao MCTI, Sunye deu continuidade às tratativas anteriores do ministério com o Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL).

Pelo MCTI, participaram também Daniel Almeida Filho (Desenvolvimento Tecnológico e Inovação), Davyd Souza Santos (Tecnologia Social e Economia Solidária) e Hugo Valadares Siqueira (Inovação Digital). O reitor foi acompanhado pelo superintendente da Fundação da UFPR (Funpar), Edemir Maciel, e pelos técnicos da Funpar, Líbia Naico e Jonivan Oliveira.

A criação de uma plataforma brasileira de bens digitais foi objeto da parte da conversa decorrente do C3SL, uma vez que o Centro tem mobilizado pesquisadores da área em todo o país para discutir a soberania tecnológica do Brasil. A experiência da Funpar com a gestão de projetos foi comentada brevemente, no tópico de acelerar o uso da Lei da Informática para o desenvolvimento de projetos de interesse nacional, aproveitando o know-how da fundação.

C3SL busca parceiros para desenvolver o projeto  MAPSBR
A reunião no MCTI foi o desdobramento de uma conversa anterior, em 2024, com o secretário nacional de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento Social, Inácio Arruda. Na ocasião, uma equipe técnica do Centro de Computação, com Luis de Bona, Edemir Maciel e Jonivan Oliveira apresentou a experiência do C3SL com projetos associando computação e impacto social, da distribuição nacional do Linux Educacional ao monitoramento de indicadores sociais, passando pelo atendimento na Atenção Primária de Saúde.

A ideia de mobilizar empresas para o desenvolvimento de uma ferramenta de geolocalização, a exemplo do Google Maps e do próprio GPS, surgiu naquele encontro e foi retomada agora, com a ideia de utilizar a Lei da Informática para esse fim. O MCTI se colocou à disposição para estruturar essa iniciativa, em parceria com a UFPR e com o C3SL, que depois poderá envolver outros institutos de ciência e tecnologia brasileiros.

Egresso da UFPR e co-fundador do DuckDB evidencia potencial do open source na resolução de desafios sociais complexos

Em entrevista ao C3SL, o ex-mestrando do PPGInf ressalta como o software livre torna o acesso a ferramentas analíticas avançadas mais simples, eficiente e disponível para pesquisadores, empresas e entusiastas ao redor do mundo

Nascido em Fortaleza, no Ceará, Pedro Thiago Timbó Holanda trilhou um caminho que o levou do DINF e do PPGInf/UFPR ao protagonismo global na comunidade de software livre. Formado em Computação pela Universidade Federal do Ceará, Pedro foi bolsista de iniciação científica desde o primeiro semestre, já com direcionamento à pesquisa em bancos de dados. “Comecei testando hipóteses, sempre em busca de novas soluções, ainda no contexto acadêmico e do software open source”, relembra.

Artigo do mestrado aprovado em evento internacional abriu portas para a criação do DuckDB, diz Pedro

Durante o mestrado na UFPR, orientado pelo professor do Dinf e pesquisador do C3SL, Eduardo Almeida, Pedro aprofundou-se no estudo de indexação adaptativa, área-chave para bancos de dados modernos e ferramentas analíticas. Sua dissertação, embasada em técnicas inovadoras como o Database Cracking, conectou sua pesquisa à linha de frente de grupos internacionais — especialmente o CWI, renomado centro holandês de pesquisa em ciências exatas.

Esse olhar inovador sobre indexação e análise de dados foi essencial na transição ao doutorado no CWI, em Amsterdã, aprofundando pesquisas em indexação progressiva. Lá, Pedro aproximou-se de comunidades de software livre e do tema que norteia sua carreira: a democratização do acesso a ferramentas analíticas eficientes.

É nesse contexto que surge sua maior contribuição: o DuckDB, banco de dados analítico de código aberto criado no CWI, do qual Pedro é cofundador do laboratório comercial, o DuckDB Labs. “A grande motivação foi aproximar a potência dos bancos de dados do universo da análise de dados no ambiente open source, tornando mais simples e acessível o processamento massivo de dados para todos”, explica.

Ao se inspirar no universo do SQLite e no apelo “SQLite for analytics”, Pedro buscou unir a simplicidade de uso e a eficiência de performance em um software livre que pudesse ser rapidamente adotado por pesquisadores, empresas e entusiastas. O DuckDB, distribuído sob licença open source, rapidamente se tornou referência mundial. O sucesso da ferramenta reflete a força da comunidade do software livre: “Quem desenvolve uma solução aberta permite avanços globais. O open source é tanto um convite quanto um compromisso de impactar o mundo”, afirma Pedro.

Pedro Thiago, o professor Eduardo Almeida e Mark Raasveldt, Co-criador do DuckDB

Durante sua carreira, Pedro também colaborou com a Microsoft, sempre defendendo a abertura do conhecimento e o impacto transformador do software livre. Essa filosofia marcou sua trajetória desde os tempos de estudante na UFPR, “onde aprendi o valor de compartilhar conhecimento e participar de comunidades acadêmicas e open source”.

Esta reportagem integra uma série de entrevistas promovidas pelo Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL) e Dinf. A iniciativa busca destacar a trajetória e as contribuições de ex-bolsistas, alunos e pesquisadores que se destacam no campo da informática, mostrando a diversidade e o impacto das pesquisas desenvolvidas nesse ambiente acadêmico e tecnológico de excelência.

C3SL – Pedro, para começar, você poderia contar um pouco sobre sua trajetória pessoal e como chegou até o desenvolvimento do DuckDB?

PEDRO – Fiz minha graduação na Universidade Federal do Ceará. Desde o meu primeiro semestre fui bolsista de iniciação científica na área de indexação de banco de dados. Então, eu passei boa parte da minha graduação já trabalhando com sistemas de banco de dados, mas no nível de pesquisa, sem implementar nada em um sistema mesmo, mas com o que a gente chama de aplicação stand-alone. Você faz basicamente o código mais simples para testar aquela sua hipótese. Quando terminei minha graduação, tive oportunidade de ou continuar trabalhando na empresa que eu estava, ou de seguir para um mestrado. E a realidade é que eu tinha meio que me apaixonado pelo sul. Eu queria ir ou para Curitiba ou para Florianópolis, dar aquele empurrão, para sair da casa dos pais, etc. Então, eu apliquei a prova para Curitiba, Florianópolis, e acho que para Porto Alegre também. E do pessoal que eu conversei, que eu me dei melhor naquela conversinha de uma hora, foi com o professor Eduardo Almeida, da UFPR. Ele também trabalhava com o que na época era meio que os grandes hypes do momento, né, que era NoSQL e Spark. Forçamento MapReduce.

Pedro Thiago e demais pesquisadores do Dinf alunos do professor Eduardo Almeida em evento científico de informática

Neste processo, fui aprovado no mestrado como orientando dele, então eu fui para Curitiba, e a gente começou trabalhando com Banco de Dados NoSQL. Ali pelo meio do mestrado a gente viu que não era uma coisa tão bacana assim, que existiam uma série de problemas dentro da utilização de Banco de Dados NoSQL que não tornava isso interessante, e foi neste ponto que mudamos completamente o tópico para voltar à indexação. Só que a partir de um tipo de indexação chamada de Database Cracking, que é uma técnica de criação de índices em que você cria os índices enquanto está executando consultas. E daí eu fiz meu mestrado nesse tópico e calhou que era um tópico que tinha sido começado pelo Grupo de Pesquisa de Amsterdã que é a CWI (Centrum Wiskunde & Informatica), que é o Centro Viscundia Informática Centro de Matemática e Informática. Quando eu terminei meu mestrado, consegui a aprovação de um paper numa conferência internacional, e foi a partir desta oportunidade que aproveitei para me inscrever em uma vaga de doutorado aqui em Amsterdã. Foi justamente por conta de ter tido esse paper do mestrado e de ter tido alguma visibilidade já e ter feito o mestrado no em um tema central na pesquisa da instituição aqui que consegui a vaga no doutorado. Nisso, vim para cá e dei continuidade na minha pesquisa sobre índice. Em 2019 o Mark Raasveldt, que por sinal era o meu colega de quarto no doutorado, começou a implementar o DUNKDB como um projeto acadêmico.

Os projetos que a gente tem na CWI é um pouco diferente de como ocorre no Brasil. Enquanto o financiamento da pesquisa no Brasil é quase na sua totalidade originária de entes públicos, aqui na Europa é usual termos a grande maioria vindo de financiamentos de iniciativa privada ou público-privados. No meu caso, o projeto era com a fabricante de automóveis Honda. Eles pagavam metade do meu doutorado e o governo holandês pagava outra metade. No caso do Mark, a empresa financiadora era a Tata Steel, empresa global do setor siderúrgico, também neste mesmo modelo de custeio com o governo. Com este modelo, éramos levados a atuar em alguns dos problemas que essas empresas tinham. Além disso, tanto o meu projeto como o do Mark eram projetos que eram mais de ciência de dados, apesar de estarmos vinculado a um grupo com foco de estudo em sistema de banco de dados e desenvolvimento de sistema. Neste momento começamos a perceber que o pessoal tinha meio que aversão a sistemas de banco de dados, o que gerou essa curiosidade nossa. Oras, estamos no campo da informática há 50 anos desenvolvendo pesquisas, tentando fazer as coisas mais rápidas e além da memória, usar todo o processamento do computador. Porém, poucos se interessam por tais soluções, e acabam usando ferramentas que são consideravas inferiores nesse sentido de performance técnico. Neste ponto, começamos a perceber que a grande motivação era que os sistemas de banco de dados eram muito complexos.

Então, se você pegava uma pessoa para fazer uma análise de dados, eles preferiam ir para um “Pandas da vida”, que é uma ferramenta mais simples. Isso porque em uma linha de comando você já está conseguindo analisar seus dados. Agora, se você fosse usar um SQL Server, um ADB, era preciso instalar o seu servidor, descobrir como é que faz a conexão do cliente, fazer criação de esquema etc. Você perde um dia para começar a ler o seu primeiro arquivo. O teu custo de interação com a ferramenta era muito grande com sistemas. É desta reflexão que gerado o DuckDB. Será que a gente consegue fazer um sistema para análise de dados que seja tão fácil de usar quanto o Pandas, mas que tenha toda essa bagagem de coisas que a gente tem feito em pesquisa? Nos últimos anos, esse é o problema que o DuckDB surge para poder resolver no universo do banco de dados.

C3SL: O slogan “SQLite for analytics” resume bem a proposta do DuckDB. Como essa analogia ajuda a compreender o projeto? E quais foram os momentos-chave que levaram à criação ou sua entrada no time do DuckDB?

PEDRO: O slogan “SQLite for Data Analytics” que encampamos e a razão desse slogan é porque a gente queria ser na verdade o mesmo que o Pandas era, mas a gente também queria que as pessoas do mundo de banco de dados entendessem a proposta, e o SQLite era o mais próximo, sendo um sistema que não demanda instalação. Contudo, o SQLite é feito para o que a gente chama de cargas transacionais, que é quando você tem muitas atualizações. Seria algo como “o Pedro mudou de endereço”, o que é considerado uma atualização, e nisso o SQLite é muito bom em fazer. Mas se você tiver um tipo de consulta, como “quero saber o que é que as pessoas entre 20 e 30 anos que moram em Curitiba compram mais”, isso é uma carga analítica que demanda uma quantidade muito grande de seus dados. Então, são sistemas com propósitos diferentes. Mas a ideia é que nossa proposta à época era ser o que o SQLite é para essas atualizações, só que para essas cargas analíticas. Em 2019 começou o desenvolvimento do DuckDB.

Apenas para destacar um “fun fact”, na época o Mark estava no Brasil, especificamente em Curitiba. Então o início do DuckDB foi desenvolvido, por coincidência, na UFPR. Claro, não tendo uma relação direta com algum projeto da universidade. O Mark estava em Curitiba, e daí eu conversei com o professor Eduardo para ver se a gente conseguia uma sala para ficar usando naquela época. Isso já era no doutorado, em 2019. Por coincidência, o comecinho aconteceu fisicamente na UFPR. Foi neste ano que comecei a implementação do sistema, com uma carga bem acadêmica, sem também grandes deslumbres ou ainda um sistema de uso real. As coisas começam a mudar um pouco ali por 2021 e 2022. É neste momento temos um insight, e começamos a perceber que existe um interesse comercial na ferramenta. Já existiam empresas que estavam utilizando a ferramenta. E em 2021 é quando criamos a DuckDB Labs, que é a empresa que presta serviço em cima do DuckDB. É ela que opera em serviço o DuckDB, que é uma ferramenta de código aberto completamente gratuita. Na verdade, não tem nada que a gente faz dentro da DuckDB Labs que não seja aberto e gratuito.

Defesa de mestrado no PPGInf da UFPR

Para se ter uma ideia, a propriedade intelectual da ferramenta não é nem da DuckDB Labs, mas sim de uma fundação. Com isso, se algo ocorre com a empresa amanhã, a propriedade intelectual e o código continuam protegido. E uma pergunta muito comum é como mantemos a empresa se a ferramenta é aberta. O modelo de negócio é baseado em desenvolver projetos com a ferramenta aberta. A gente pode ter um projeto com outra empresa grande, como a Google. Eles utilizavam a DuckDB internamente dentro de um ou outro projeto deles, e precisavam que uma determinada carga de trabalho de junção bem específica fosse implementada para poder acelerar o processo deles. Neste caso, fechamos um contrato com a DuckDB Labs, um dos engenheiros vai e trabalha com eles pelo período que seja necessário para implementar. O business é esse desde o começo. A ferramenta foi toda desenvolvida com recurso público, e a ideia foi dar o retorno aos contribuintes deixando-a aberta, para que todos possam usar. O modelo de negócio envolve em aplicá-la em projetos.

C3SL: Hoje, como é a estrutura dos clientes e seus desafios em nível de complexidade de demandas?

PEDRO: Os projetos são bem diferentes, e a complexidade depende muito da necessidade dos clientes. Desta forma, é muito variada a complexidade. Temos alguns projetos que pedem para fazer melhorias no Iceberg, em outros, há pedidos para aprimoramentos dos da base dos clientes. O DuckDB é uma ferramenta que pode comunicar por diversas linguagens, como C++, Java, Go. Cada um desses é um cliente diferente, e cada um desses é desenvolvido à parte. Por exemplo, o nosso cliente que eu diria que é o mais forte é o Python. Por outro lado, tem uma outra empresa que está mais interessada no cliente Go que a gente tinha desenvolvido há um tempo, mas que só estava com a base. Agora estão pagando pelo desenvolvimento completo.  A complexidade de você desenvolver um cliente e de desenvolver uma integração com o Iceberg são diferentes. No fim das contas, o projeto é mais sobre o tempo gasto daquilo, do que realmente complexidade.

C3SL: A DuckDB fez uma implementação de suporte ao Delta Lake. O que motivou essa decisão e o que ela representa para os usuários e para o cenário do código aberto?

PEDRO: Se você é um usuário da Oracle, tem os seus arquivos salvos na Oracle. Caso queira migrar para um outro sistema, é uma grande dificuldade. No fim, você fica preso. Ou você aceita pagar o que eles quiserem te cobrar, ou você vai ter um custo caro para fazer uma migração. Além disso, migrações são complexas, pois há a necessidade de garantir que seus dados estão corretos no processo. A ideia do Delta Lake é que, em vez de ter um armazenamento de um sistema proprietário, você faria tudo com arquivos que são públicos. No caso, você usaria arquivos parquet que qualquer sistema pode ler ou escrever, e você usaria os outros arquivos JSON e AVRO, que também são arquivos formados públicos, que qualquer sistema pode teoricamente implementar um leitor e uma escrita, porque o formato é aberto. Então, a ideia do Data Lake era basicamente isso.

Em vez de um armazenamento privado, usar esses arquivos de armazenamento público para armazenar os dados. Se o fulano que tem os dados dele usou o Oracle para escrever os dados dele usando o Iceberg, que é basicamente uma coleção de parquet, JSON e AVRO, quiser usar um outro sistema para ler, não tem migração nenhuma. Se os dois sistemas sabem ler, o custo de migração é zero, porque os dados estão em um arquivo aberto, de formato aberto. Por qual motivo a gente decidiu criar um sistema? Basicamente você tinha três formatos: o Hoodie, o Iceberg e o Delta Lake que é do Databricks. São muito similares, sendo uma coleção de arquivos parquet, com uma linha de arquivos JSON, com outra linha de arquivos json e com um arquivo AVRO. Em cada alteração ou leitura, você tem que ir por todos esses arquivos, até chegar aonde os seus dados estão armazenados nesse parquet, e após isso trazer os dados de novo para o cliente. Quando você tem a atualização, é preciso criar novos arquivos. Isso vai aumentando essa estrutura, o que faz com que ela se consolide como uma estrutura muito complexa. A grande razão a que foi criada essa estrutura é porque eles não queriam ter um sistema de banco de dados nesse meio, para não depender de um sistema de certo modo, queriam só arquivos. Porém, eventualmente acabaram adicionando um sistema de banco de dados, o Postgres, para conseguir armazenar qualquer arquivo do topo que era a versão correta. Assim, acabaram adicionando um sistema de banco de dados de qualquer jeito. O que a nós da DuckDB fizemos foi revisitar essa solução. Nós já temos um sistema de banco de dados, um sistema aberto, e a dúvida que surgiu foi: “será que conseguimos eliminar todo esse monte de arquivo no meio, manter os parquets para armazenar os dados, usar um sistema de banco de dados que seja gratuito e aberto e que a maioria das pessoas tem? Será que a gente não consegue se limitar só a SQL 92 e garantir que vários sistemas possam ser utilizados, e a pessoa não fica presa ao Postgres? Daí veio a ideia do Delta Lake, que foi meio que o grande lançamento de dois meses atrás.

A abordagem era exatamente poder usar um sistema de banco de dados. Existe toda a especificação das consultas que são utilizadas. A única obrigatoriedade é que o sistema que está sendo usado tem que garantir transação ACID (atomicidade, consistência, isolamento e durabilidade), e garantir que suas transações são seguras. Mas você pode usar qualquer sistema. Como essa do Duck Lake, ela é uma especificação, mas a gente também tem uma implementação para o DuckDB, e na nossa implementação você pode usar como esse catálogo tanto o Postgres, como o MySQL, ou o SQLite, ou ainda o próprio DuckDB. A ideia é mostrar que você não está preso a nada, e que você pode usar qualquer sistema, eliminando essa grande quantidade de arquivos. Com isso você tem um ganho de performance muito alto. O resultado é que chegamos a ver ganho de performance em atualização de duas ordens de magnitude. Ou seja, se um procedimento demorasse um segundo para uma transação, ele passaria demorar 0.01. É uma diferença gritante de performance. Considero que é uma mudança de jogo comparado às outras ferramentas. A maior dificuldade, como qualquer standard que você cria, é a adoção. O Iceberg, por exemplo, já está bem definido, com vários sistemas que usam ele. O Snowflake o usa, o próprio Databricks, o Trino. O desafio é fazer esses usuários mudarem para um formato novo, criar uma cultura. E temos conquistado boa aceitação. Isso também pela vantagem que tem o sistema em reduzir o custo de pessoal para implementar. Um suporte para o Iceberg ou um Oracle, por exemplo, não é fácil de implementar. É preciso ter um time de engenheiros. No Duck Lake, você só precisa falar SQL. Ou seja, a curva de aprendizagem e de aplicação é extremamente mais curta do que qualquer outro.

Para ter uma ideia, estamos implementando a integração com o Iceberg, e temos um time hoje de quatro pessoas que está trabalhando há um ano neste projeto. A nossa implementação do Duck Lake demorou três meses, com uma pessoa. Fica evidente que a dificuldade de implementar um e outro é gritante. Eu diria que a diferença de tempo é de uma ordem de magnitude. Isso torna o Duck Lake muito atraente, ainda mais para sistemas menores, por conta do custo. O sistema já está maduro o suficiente para poder começar a implementação, porém, logo que alcançarmos a versão 1.0, e tivermos um desses grandes sistemas implementando, isso passa a dar uma garantia de que há um padrão que está sendo mais aceito. Temos uma confiança muito alta no nosso sistema, e temos um número de download ou número de estrela no GitHub com um pico gigantesco. O DuckDB hoje tem entre 20 a 30 milhões de downloads por mês. Cada download seria, basicamente, uma utilidade, de pequeno a grande porte. Se você imaginar a Tesla, o Google, o Facebook, eu sei que já usaram o sistema, assim como a Airbnb.

C3SL – Nesta trajetória toda, qual o papel do DINF, do PPGInf e das instituições de ensino públicas brasileiras?

PEDRO: Cada passo e cada etapa da minha formação foi importante e contribuiu para este processo. E certamente o mestrado no PPGInf com o professor Eduardo foi essencial. Ele me ajudou muito. Como orientador, ele me impulsionou bastante. Ele até brinca, ele chama de programar em baixaria, que é fazer programação em linguagem de baixo nível. A minha experiência antes da minha graduação tinha sido mais alto nível, o nível de programação. Então o professor Eduardo me puxou para coisas que eram mais atraentes para sistemas. Ele me puxou mais para fazer implementação que não é dentro do sistema, porque fazer isso no Brasil ainda é muito complexo. E a razão pela qual é complexo é que se você vem para um grupo aqui, se você vem fazer hoje um mestrado ou doutorado na CWI, ao seu redor estão os rapazes que implementam no sistema.

Defesa da tese de Pedro Thiago, na Centrum Wiskunde & Informatica

Por mais que o sistema esteja aberto, a tua barreira de entrada é muito baixa. E no Brasil a gente não tem essa proximidade. Mas o professor Eduardo me puxou para fazer isso, fazer a minha própria aplicação de qualquer. Ele me ajudou muito com a escrita, com a apresentação dos projetos. A pesquisa que a gente fez, que foi basicamente uma atualização de uma estrutura de dados que já existia para um tipo de problema. A gente teve um ganho de performance bom com a ideia.  E o importante foi a metodologia aplicada. Seguimos todo o processo de você ter uma hipótese, de implementar, validar, escrever o artigo e gerar as figuras. Também foi muito importante ter conseguido uma publicação internacional com o professor, que foi o que abriu a porta para eu vir para cá, em Amsterdã. Da mesma forma foi importante ter uma publicação da conferência regional a partir da graduação. Cada etapa é o que chamamos de stepping stones. Cada coisa vai te elevando um pouco além, e vai te abrindo novas oportunidades. Sem dúvida alguma, eu não estaria aqui se não fosse pela formação no Brasil, tanto na graduação como no mestrado. Todas as oportunidades são, sem dúvidas, dadas por conta da universidade.

C3SL – Que conselhos você daria hoje para estudantes brasileiros que gostariam de colaborar com o DuckDB ou projetos open source de alta complexidade?

PEDRO: Todo projeto de alta complexidade também tem problemas de baixa complexidade. O DuckDB, se você pegar a parte central dele, a parte realmente do sistema de banco de dados, é muito complexo. Se você for mexer no otimizador, fazer um novo algoritmo de junção, isso não são coisas fáceis. O DuckDB tem vários clientes. Assim, uma sugestão é contribuir para o sistema já atuando junto a um dos clientes. É uma barreira menor para você começar a entrar dentro do sistema. Agora, olhando para o Pedro do passado, se pudesse, o conselho que daria é investir muito no aprendizado do inglês. Afinal de contas, para ser apto a contribuir para esses projetos, a comunicação vai ser toda em inglês. Isso é um fato, isso não vai mudar. É preciso ser capaz de se expressar, de exprimir ideias e debater elas. Ainda mais quando você tem esse tipo de discussão online e assíncrona, como muitas vezes ocorre. Você tem que estar mais apto a conseguir realmente escrever e relatar suas ideias.

O aprendizado disso começa a ser evidente na graduação e pós, quando é necessário usar esta capacidade comunicativa nos papers. Um segundo conselho é que encontre projeto que você gosta, que te interessa, que seja gratuito, que seja open source e contribua para ele. Porque, em geral, vários projetos têm até uma própria tag de Good First Issue. Além de investir no aprendizado, há também, neste caso, uma demonstração de interesse nos projetos que pode ajudar lá na frente. Só para se ter uma ideia, nesse exato momento, estou fazendo seleção para os estagiários desse ano. Se tem alguém que já contribuiu para o DuckDB, com o que quer que seja, mesmo uma coisa pequena, já está a um passo além de quem não contribuiu. Isso pelo fato de que esta pessoa já demonstrou previamente que consegue atuar, que tem algum certo tipo de entrega de sistema, que consegue compilar, consegue executar, consegue rodar teste e modificar o código. Isso modifica muito as possibilidades. No caso do DuckDB, quem quiser contribuir, pode também aproveitar as extensões que o ele permite usar. Você consegue criar algoritmos novos, operadores novos. Acho que quase tudo hoje no sistema é extensível, fazendo uma coisa completamente externa ao DuckDB. Então, a minha dica paraquem está fazendo pesquisa em sistemas de banco de dados, especificamente, é se você estiver fazendo mestrado, na graduação também, ou doutorado, é tentar implementar uma extensão do DuckDB para aquilo que você está pesquisando.

Artigo no Le Monde Diplomatique enfatiza referência do C3SL na soberania digital brasileira

Texto alerta para riscos econômicos e institucionais da hegemonia das big techs, e aponta que país gastou mais de R$ 10 bilhões em software e infraestrutura das empresas estrangeiras

O Brasil permanece vulnerável diante da dependência crescente de tecnologias estrangeiras, alerta o pesquisador Ergon Cugler de Moraes Silva, do Laboratório de Estudos sobre Desordem Informacional e Políticas Públicas (DesinfoPop/FGV), em artigo publicado no Le Monde Diplomatique Brasil. A análise, publicada nesta terça-feira (22), ganha relevância após recentes episódios em que o governo brasileiro foi alvo de pressões oriundas do cenário global, intensificadas por políticas unilaterais de Donald Trump e pelo domínio das big techs norte-americanas sobre o setor de nuvem e processamento de dados públicos.

Segundo o texto, de 2024 a 2025, o Brasil gastou mais de R$ 10 bilhões em software e infraestrutura fornecidos por empresas como Google, Microsoft, Oracle e Amazon – recursos que poderiam fortalecer centros nacionais de pesquisa, criar infraestrutura própria ou gerar políticas de fomento à inovação. Tal dependência, argumenta Silva, deixa o país exposto a ameaças econômicas, políticas e à possibilidade de vazamento de informações sensíveis.

Apesar do cenário ainda predominantemente desfavorável, o artigo apresenta caminhos viáveis para a construção de soberania digital. E, neste ponto, destaca o Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL), vinculado à Universidade Federal do Paraná (UFPR). Com mais de vinte anos de trajetória, o C3SL é apontado como referência em desenvolvimento de soluções de software livre e ciência de dados, contando com equipe altamente qualificada e infraestrutura própria. O caso do C3SL evidencia que o Brasil reúne competência técnica para criar e manter alternativas eficientes e seguras, faltando, na visão do pesquisador, apenas vontade política e investimentos planejados de médio e longo prazo.

“Temos universidades com excelência reconhecida internacionalmente. Temos redes de pesquisadores altamente qualificados. Temos experiência acumulada em governo digital, em dados abertos, em participação cidadã. Temos o Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL), da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que é um exemplo real e que há mais de 20 anos desenvolve soluções robustas em software livre e ciência de dados com infraestrutura própria e equipe altamente qualificada. Vimos inclusive, com o estudo que publicamos, que temos também dinheiro para investir em tecnologia. O que falta não é competência técnica. É decisão estratégica. É vontade política de transformar essa competência em infraestrutura, essa infraestrutura em soberania e essa soberania em proteção institucional”, aponta Ergon no artigo.

Leia a íntegra do artigo em https://diplomatique.org.br/a-chantagem-de-trump-evidencia-que-precisamos-de-soberania-digital/

C3SL realiza semana de integração com novos pesquisadores de graduação

Com recorde de inscrições, o laboratório de inovação da UFPR acolhe novos pesquisadores para atuarem em projetos estratégicos nas áreas de saúde e educação

O Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL) promoveu, entre os dias 30 de junho e 4 de julho, a tradicional semana de integração e capacitação para os novos bolsistas. A atividade de boas-vindas reuniu 21 estudantes selecionados em um processo seletivo com recorde de 93 inscritos, provenientes dos cursos de Ciência da Computação e Informática Biomédica da UFPR.

Sob coordenação do gerente de projetos do C3SL e mestrando do PPGInf, Richard Heise, as capacitações ofereceram aos novos pesquisadores uma imersão nas dinâmicas de pesquisa, organização dos projetos e na metodologia de desenvolvimento de inovações adotada pelo laboratório. A iniciativa visa preparar os bolsistas para atuarem em equipes multidisciplinares, integrando professores doutores e demais pesquisadores. A semana de integração contou com programação abrangente, desde a apresentação da instituição e seu ambiente computacional até temas essenciais como redes, serviços, controle de versão com Git local e remoto, além de introdução ao Docker, bancos de dados e o funcionamento da web.

Atualmente, o C3SL conta com pesquisadores professores doutores do Departamento de Informática (Dinf) da UFPR, e pesquisadores bolsistas de graduação, mestrado e doutorado, trabalhando em três grandes projetos em andamento: o desenvolvimento de Sistemas de Informação para a Atenção Primária à Saúde (APS) em parceria com o Ministério da Saúde; o Laboratório de Dados Educacionais; e a plataforma de Recursos Educacionais Digitais do Ministério da Educação (MEC).

Cada bolsista é alocado em equipes específicas conforme seu perfil, habilidades e preferências indicadas durante a entrevista seletiva. Com uma dedicação semanal de 20 horas presenciais nas dependências do Dinf, os novos integrantes terão a oportunidade de contribuir diretamente para projetos que impactam áreas essenciais como saúde e educação no Brasil.

Reunião da reitoria da UFPR, MCTI e C3SL discute soberania digital e bens públicos digitais no país

Encontro em Curitiba reúne pesquisadores, gestores públicos e representantes da sociedade civil para debater soberania digital, inclusão e criação de um centro nacional para articular e ampliar o ecossistema de software livre e bens digitais públicos no Brasil

Nesta segunda-feira (7), o Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL) participou de reunião na reitoria da UFPR para discutir uma agenda nacional que organize a sociedade civil, os entes governamentais e a população em defesa dos Bens Públicos Digitais Nacionais. O C3SL figura como um dos operadores centrais da proposta da frente em defesa desses bens digitais, atuando para fortalecer o ecossistema de software livre e soluções abertas no país. Entre os temas centrais, destacou-se a necessidade de rearticular e integrar as comunidades de software livre, garantindo maior apoio institucional para ampliar seu impacto na inovação e na administração pública.

O encontro contou com a presença do reitor da UFPR e um dos fundadores do C3SL, Marcos Sunye; do atual coordenador do C3SL, Marcos Castilho; do pesquisadores Fabiano Silva e Luis Bona (pró-reitor de planejamento e dados da UFPR); Nésio Fernandes De Medeiros Junior, médico sanitarista, diretor do Instituto de Desenvolvimento e Apoio a Gestão – IDAG e um dos articuladores da frente em defesa dos Bens Públicos Digitais Nacionais; Pedro Torres, da coordenação da Agência de Tecnologia da Informação e Comunicação (AGTIC); Corinto Meffe, coordenador de Responsabilidade Socioambiental do Dataprev; Delfino Natal de Souza, consultor independente especialista em gestão da informação e governança de dados. Também participaram do encontro Edemir Reginaldo Maciel, diretor superintendente da Fundação da UFPR (Funpar); Hugo Valadares, diretor do Departamento de Ciência, Tecnologia e Inovação Digital (DECTI) do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI); Ergon Cugler de Moraes Silva, analista de dados e pesquisa da More in Common; Guilherme Alberto Almeida de Almeida, diretor de Inovação e Gestão do Conhecimento do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos; Laura Rodrigues, da Frente Hacker, da União da Juventude Socialista; e Fabricio Solagna, do Coletivo Digital.

Nésio Fernandes de Medeiros Junior destacou a importância de rearticular as comunidades de software livre no Brasil. Segundo ele, muitas dessas comunidades seguem ativas, mas carecem de maior integração e apoio institucional para ampliar sua atuação. “A tecnologia da informação é estratégica para a gestão pública, especialmente quando baseada em evidências. O espaço público brasileiro oferece inúmeras oportunidades para inovação, desde que as instituições saibam utilizar seu poder normativo e de articulação”, afirmou.

Nésio ressaltou que o software livre merece um lugar institucional protegido, que ofereça uma perspectiva de longo prazo e um espaço de articulação para os atores envolvidos. Para isso, defendeu a retomada e o fortalecimento de uma frente que debata e defenda a pauta dos bens públicos digitais, pautando o tema em fóruns nacionais, internacionais e regionais, projetando a agenda dos veículos digitais abertos no cenário da soberania digital do país.

O reitor da UFPR, Marcos Sunye, apresentou três pontos fundamentais para o debate sobre soberania digital e bens públicos digitais no Brasil. O primeiro deles é a proteção desigual entre dados públicos e privados. Enquanto a Lei de Acesso à Informação obriga o Estado a divulgar seus dados, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) protege o setor privado, que não é obrigado a revelar as informações que possui. “Temos uma lógica que penaliza o público e protege o privado. Por que uma empresa privada não entra na lei, ou pelo menos não precisa dizer quais dados possui e sobre quem?”, questionou.

O segundo ponto destacado pelo reitor é o aprisionamento tecnológico das instituições públicas. Sunye criticou uma diretiva da Secretaria de Gestão que proibiu universidades de manter seus próprios data centers, obrigando-as a hospedar dados em nuvem de terceiros, o que limita o controle sobre a infraestrutura tecnológica. “Depois de toda aquela movimentação no início do século sobre autonomia tecnológica, as universidades, que eram grandes vetores para políticas públicas, foram proibidas de ter data centers. Isso é aprisionamento tecnológico”, afirmou. Ele também lamentou a dependência das universidades em relação a grandes empresas de tecnologia para serviços essenciais, como servidores de e-mail, que têm acesso a dados importantes para a inovação.

Por fim, Sunye destaca a falta de debate sobre inteligência artificial com perspectiva do Sul Global. Neste ponto, o fundador do C3SL criticou que a discussão atual se limita ao uso de ferramentas como ChatGPT na educação, sem abordar a criação de inteligência artificial alinhada às necessidades e realidades do Sul Global. “Ninguém tem um discurso de como fazer uma IA no Sul Global. A discussão é só como usar, como se a posta já estivesse dada. Se você não pega, vai ficar atrasado”, alertou. O país enfrenta desafios para avançar em pautas como inclusão digital e adoção de soluções abertas, muitas vezes atrasadas em relação ao seu potencial.

A incompatibilidade de sistemas proprietários é uma barreira que precisa ser superada, reforçando a urgência de promover bens públicos digitais abertos e colaborativos. Apesar dos avanços tecnológicos, a inclusão digital permanece um desafio especialmente no serviço público, onde muitos municípios ainda não têm acesso ou qualificação para utilizar recursos digitais de forma eficaz. Diante desse cenário, os participantes da reunião propuseram a criação de uma organização com abertura ampla para participação da sociedade civil, universidades, empresas, governo e sociedade em geral. Esse centro funcionaria como um espaço de articulação, acolhendo iniciativas já existentes e fomentando novas, com projeção nacional e internacional.

O momento atual, marcado por transformações como a inteligência artificial e o controle das mídias sociais, exige iniciativas coletivas, colaborativas e independentes, capazes de promover inovação, integração e letramento digital. A criação desse centro é vista como uma oportunidade singular para consolidar décadas de trabalho, fortalecer o software livre e ampliar o acesso a bens digitais públicos no Brasil.

Pesquisador do C3SL é destaque em reportagem sobre tecnologia e segurança para a terceira idade

Especialista em cibersegurança, André Grégio aborda desafios e soluções para inclusão digital e proteção dos idosos no uso de tecnologias, destacando a importância da autonomia e da segurança contra golpes virtuais

O professor do Departamento de Informática (DINF) da UFPR e pesquisador do Centro de Computação Científica e Software Livre (C3SL), André Grégio, foi destaque na reportagem exibida no telejornal Meio Dia Paraná, no último dia 21 de maio, que integrou a série “Além da Idade”. A matéria abordou a relação da terceira idade com a tecnologia, apontando como o avanço digital tem deixado de ser uma barreira para se tornar uma importante ferramenta para melhorar a qualidade de vida dos idosos.

Na reportagem, o pesquisador do C3SL destacou os principais riscos que os idosos enfrentam no ambiente digital, como golpes de clonagem de cartão, fraudes via Pix e falsas centrais de atendimento, explicando de forma didática como identificar armadilhas comuns. Ele ressaltou que muitos golpes envolvem pedidos de pagamento via Pix para pessoas físicas, o que deve despertar a atenção dos usuários. O professor enfatizou a importância da cautela, do questionamento e da busca por ajuda antes de fornecer dados pessoais ou clicar em links desconhecidos.

Além disso, a reportagem mostrou histórias inspiradoras de idosos que superaram o medo da tecnologia, como Dona Hilda, que aos 80 anos utiliza dois celulares e realiza pagamentos via Pix com autonomia, e Marcos, que passou a usar aplicativos bancários após participar do curso gratuito de inclusão digital oferecido pela UFPR. O curso, que já atendeu mais de 400 pessoas, foca em desenvolver a competência digital e a segurança dos idosos no uso de dispositivos móveis.

Outro ponto importante abordado foi a visão positiva do professor André Grégio sobre a tecnologia, destacando que, quando usada de forma adequada, ela pode humanizar as relações e ampliar a participação social da terceira idade. Ele também é responsável pelo desenvolvimento de aplicativos voltados para pacientes bariátricos e oncológicos, que facilitam a comunicação entre médicos e pacientes, demonstrando o impacto social da tecnologia. Clique no link e confira a reportagem na íntegra no GloboPlay> https://globoplay.globo.com/v/13619987/